Indianismo

O indianismo foi uma corrente literária do romantismo brasileiro. Valorizou o protagonismo indígena e a selva brasileira. Teve autores como José de Alencar e Gonçalves Dias.

Indianismo foi uma corrente literária do romantismo brasileiro. As obras indianistas apresentam nacionalismo, idealização do amor e da mulher, visão teocêntrica e valorização da moral burguesa. O indígena é o grande herói nas narrativas indianistas, as quais valorizam também a floresta brasileira.

Essa vertente literária fez parte de um processo de reconstrução da história nacional e construção de uma identidade brasileira. Contou com romancistas como José de Alencar, autor de Iracema, O guarani e Ubirajara. Já a poesia indianista tem como seu maior representante o poeta Gonçalves Dias, autor do poema épico Os timbiras.

Leia também: Condoreirismo — a última geração do romantismo brasileiro

Resumo sobre indianismo

  • O indianismo foi uma corrente literária do romantismo brasileiro.
  • A literatura indianista tem como símbolos o heroico indígena e a natureza brasileira.
  • O indianismo fez parte de um processo de construção da identidade nacional.
  • Amor e mulher idealizados também estão presentes nas obras indianistas.
  • José de Alencar, autor de Iracema, foi o principal nome do romance indianista.
  • Gonçalves Dias, autor de Os timbiras, foi o principal autor da poesia indianista.

O que é indianismo?

O indianismo foi uma corrente literária brasileira que surgiu durante o romantismo. Esteve presente na literatura romântica do século XIX, no Brasil, e consistiu no protagonismo indígena nas obras do período. No entanto, o personagem principal não é um indígena real, mas um ser idealizado segundo a visão eurocêntrica que predominava no Brasil, ou seja, com valores cristãos e burgueses.

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Características do indianismo

Nessa perspectiva romântica, o indígena é retratado como herói nacional. O homem indígena é valente e guerreiro. A mulher indígena é bela e idealizada. Há também o enaltecimento da natureza, tendo a selva como plano de fundo. Dessa forma, tanto o indígena quanto a natureza se transformam em símbolos nacionais.

Homem indígena em pé, no barco onde dorme uma moça branca, uma representação do indianismo na pintura romântica.
O indianismo valoriza o protagonismo indígena. Na imagem, Peri e Ceci, personagens da obra O guarani, de José de Alencar.

A idealização amorosa romântica está presente. Além disso, é evidenciada uma convivência harmônica entre o indígena colonizado e o europeu colonizador. As obras indianistas também apresentam caráter teocêntrico e valores medievais, como a vassalagem amorosa, em que o indígena é o vassalo, enquanto o europeu é o sano.

Isso porque tais obras eram escritas por pessoas não indígenas. Para dar certa verossimilhança às narrativas e às poesias, às vezes o autor inseria palavras do vocabulário indígena. Mas isso não representava a voz dos povos indígenas, e sim a dos colonizadores ou a da classe burguesa brasileira do século XIX.

Veja também: Macunaíma — romance modernista sobre um herói brasileiro sem caráter

Objetivos do indianismo

O indianismo fez parte do processo de construção de uma identidade brasileira. Por meio dessa corrente literária, os autores buscavam valorizar um idealizado processo de miscigenação resultante de uma fictícia harmonia entre a pessoa indígena e o colonizador.

Dessa forma, empreenderam uma reconstituição do ado histórico, ou seja, eliminaram a realidade de violência e opressão que constituiu a colonização europeia e construíram uma história fictícia da formação do Brasil. Assim, as obras indianistas pretendiam despertar no povo brasileiro um sentimento de nacionalidade atrelado à valorização dos valores burgueses.

Autores do indianismo

Obras do indianismo

Dois indígenas e um homem branco na capa do livro Iracema, de José de Alencar, publicado pela editora Lugar de Sol.
Capa do livro Iracema, de José de Alencar, publicado pela editora Lugar de Sol.[1]
  • Primeiros cantos (1846), de Gonçalves Dias
  • Segundos cantos (1848), de Gonçalves Dias
  • Últimos cantos (1851), de Gonçalves Dias
  • Os timbiras (1857), de Gonçalves Dias
  • O guarani (1857), de José de Alencar
  • Simá (1857), de Lourenço da Silva Araújo
  • Gupeva (1861), de Maria Firmina dos Reis
  • Iracema (1865), de José de Alencar
  • Jupira (1872), de Bernardo Guimarães
  • Ubirajara (1874), de José de Alencar

As obras Primeiros cantos, Segundos cantos e Últimos cantos trazem também poesia lírico-amorosa, além de poesia indianista.

Romance indianista

O romance indianista é construído com base em uma história de amor entre uma pessoa indígena e um europeu. É, portanto, de caráter nacionalista, já que tem como objetivo despertar o sentimento de nacionalidade do povo brasileiro. Assim, por meio da ficção, o autor buscava construir uma identidade brasileira.

O guarani, de José de Alencar, é um dos primeiros romances indianistas de nossa literatura. Nessa narrativa, o heroico indígena Peri se apaixona pela jovem branca de origem portuguesa Ceci (diminutivo de Cecília). Porém, é Iracema, do mesmo autor, o grande romance indianista.

Nessa obra, a indígena Iracema abandona sua tribo para viver com seu amado guerreiro branco e português Martim. Simbolicamente, a heroica, bela e sofrida Iracema dá à luz o primeiro brasileiro, chamado Moacir. Desse modo, Iracema é a grande mãe da pátria brasileira.

De forma geral, no romance indianista, um dos protagonistas é indígena. Traços da cultura indígena são impressos na narrativa para criar certa verossimilhança. Porém são os valores burgueses (e não a cultura indígena) que são enaltecidos, valores como coragem, humildade, amor, fé etc.

→ Videoaula sobre romance indianista

Poesia indianista

O grande nome da poesia indianista foi Gonçalves Dias. Além da poesia de caráter lírico, o destaque é a poesia épica indianista. Assim, Os timbiras é a principal obra épica do autor. Essa narrativa, composta na maior parte por versos decassílabos, relata a rivalidade entre duas tribos, os timbiras e os gamelas.

O objetivo da poesia indianista é o mesmo do romance indianista, ou seja, despertar o sentimento de nacionalidade em prol da construção da identidade brasileira. Desse modo, ficam em evidência personagem e traços da cultura indígena. Gonçalves Dias também é autor de outro poema narrativo conhecido — “I-juca-pirama” (do livro Últimos cantos).

História do indianismo

O indianismo surgiu após a independência do Brasil (ocorrida em 1822), particularmente no Segundo Reinado (1840-1889), quando se viu a necessidade política de se criar uma identidade nacional. Segundo Luana dos Santos Santana e Christina Bielinski Ramalho:

Com a necessidade da criação de uma identidade nacional, D. Pedro II comprometeu-se a dar 15 mil réis anuais e franquia dos hospitais ao poeta que conseguisse celebrar uma poesia épica que se irmanasse com Os Lusíadas, de Camões. Em tese, o Imperador convocara todos os poetas da nação, e concorria ainda para o prêmio a glória de ser reconhecido como o maior entre todos os poetas da nação, [...]. Estimulado por essa oportunidade, Gonçalves Dias compôs sua obra épica Os Timbiras (1857), [...]. Logo, foi com o interesse de se tornar uma epopeia nacional que Os Timbiras foi escrito. [...].

Isso mostra que o indianismo foi reflexo de um projeto político de construção de uma identidade nacional e não apenas um projeto literário. No entanto, Os timbiras, de Gonçalves Dias, é uma obra inacabada do autor. De qualquer forma, outras obras dele e de outros autores deram consistência à literatura indianista.

Saiba mais: Como o negro foi representado na literatura brasileira ao longo da história?

Exercícios resolvidos sobre indianismo

Questão 1 (Ufla)

I-JUCA-PIRAMA
Gonçalves Dias (1823-1864)

           
“Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas,
Nas selvas cresci;
Guerreiros, descendo
Da tribo tupi.

Da tribo pujante,
Que agora anda errante
Por fado inconstante,
Guerreiros, nasci:
Sou bravo, sou forte,
Sou filho do Norte;
Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi,”

[...]

— “Tu choraste em presença da morte?
Na presença de estranhos choraste?
Não descende o cobarde do forte;
Pois choraste, meu filho não és!
Possas tu, descendente maldito
De uma tribo de nobres guerreiros,
Implorando cruéis forasteiros,
Seres presa de vis Aimorés.”

Dias, Gonçalves. Literatura comentada — Abril Educação — 1982, p. 47-53.

O título do poema I-Juca-Pirama, traduzido da língua tupi, equivale em português a: “O que há de ser morto, e que é digno de ser morto”. Este poema, composto de dez partes, narra o drama vivido por um índio tupi que é feito prisioneiro pelos timbiras. As duas primeiras estrofes do texto pertencem à IV parte e a 3a estrofe, à VIII parte.

Para o guerreiro da “tribo tupi”, o medo é sinônimo de

A) decadência.

B) desânimo.

C) maldição.

D) covardia.

E) inconstância.

Resolução:

Alternativa D.

Na terceira estrofe, fica evidente que o medo é sinônimo de covardia. Afinal, o indígena  sugere que é covarde quem chora (tem medo) diante da morte.

Questão 2 (Unimontes)

Para responder à questão, considere a obra Iracema, de José de Alencar, e especialmente, o fragmento abaixo:

“O dia enegreceu; era noite já.

O pajé tornara à cabana; sopesando de novo a grossa laje, fechou com ela a boca do antro. Caubi chegara também da grande taba, onde com seus irmãos guerreiros se recolhera depois que bateram a floresta, em busca do inimigo pitiguara.

No meio da cabana, entre as redes armadas em quadro, estendeu Iracema a esteira da carnaúba, e sobre ela serviu os restos da caça, e a provisão de vinhos da última lua. Só o guerreiro tabajara achou sabor na ceia, porque o fel do coração que a tristeza espreme não amargava seu lábio.

O pajé bebia no cachimbo o fumo sagrado de Tupã que lhe enchia as arcas do peito; o estrangeiro respirava ar às golfadas para refrescar-lhe o sangue efervescente; a virgem destilava sua alma como o mel de um favo, nos crebros soluços que lhe estalavam entre os lábios trêmulos.”

Disponível em: http://objdigital.bn.br/Acervo_Digital/Livros_eletronicos/iracema.pdf. o em: 4 out. 2018.

Todas as afirmativas abaixo sobre a obra Iracema, de José de Alencar, são verdadeiras, EXCETO

A) Essa prosa romântica indianista contribui para a construção de uma metáfora da transfiguração étnica da história da nação brasileira.

B) A personagem-título, anagrama de América, representa a tensão experimentada em uma nação mestiça.

C) O lirismo da composição alencariana não apaga o presságio de uma certa marginalização feminina.

D) Trata-se de uma adequada abordagem da representação do índio na literatura brasileira contemporânea.

Resolução:

Alternativa D.

O indígena na literatura indianista não é representado como ele realmente é, mas por uma visão idealizada do autor. Portanto, a sua representação não é adequada, já que desvia da cultura indígena como de fato ela é. Além disso, o fato de o livro ser de autoria de um não indígena indica que a abordagem da representação indígena está limitada a um olhar estrangeiro. Além disso, Iracema não faz parte da literatura contemporânea.

Créditos da imagem

[1] Editora Lugar de Sol (reprodução)

Fontes

ABAURRE, Maria Luiza M.; PONTARA, Marcela. Literatura: tempos, leitores e leituras. 4. ed. São Paulo: Moderna, 2021.

FERREIRA, Cristina; LENZ, Thiago. Duas narrativas para o lugar dos indígenas nas origens da nação: a história ficcional de Magalhães e Alencar. Almanack, Guarulhos, v. 23, set./ dez. 2019.

PEREIRA, Danglei de Castro. Representação literária do indígena no romantismo brasileiro: o caso Simá, de Lourenço Amazonas. Revista Brasileira de Literatura Comparada, Manaus, v. 22, n. 39, jan./ abr. 2020.

SANTANA, Luana dos Santos; RAMALHO, Christina Bielinski. Os timbiras (1857), de Gonçalves Dias: recursos épicos, invocação e anacronismo. Cadernos da Fucamp, Monte Carmelo, v. 20, n. 45, p. 46-61, 2021.

SANTOS, Luzia Aparecida Oliva dos. O percurso da indianidade na literatura brasileira: matizes da figuração. São Paulo: Editora UNESP/ Cultura Acadêmica, 2009.

Publicado por Warley Souza

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